No Céu e no Inferno
5 de abril de 2012 | 11 Comentários
Desde a goleada contra o The Strongest que tenho notado uma nova acomodação nas arquibancadas do Beira-Rio. Sem os “líderes”, torcidas mais ou menos desorganizadas, umas puxando cantos daqui, outras dali, a torcida colorada se redescobre. No jogo contra os bolivianos até antigos cantos, parecendo que entoados de outras épocas, ecoaram pelas vozes vermelhas. Ontem às noite contra o Santos não foi diferente. Mas deixem eu c0meçar minha história do começo, claro, que aqui eu não falo de táticas, nem o motivo da, ainda espero, existência deste espaço. O motivo da existência deste espaço é a torcida. A torcida e sua loucura. Literatura e futebol. Escritores ou candidatos à escreventes tentando pintar as cores das almas que se diluem nos estádios. A alma com que faz que eu esteja aqui, três da manhã, envolto nas penumbras de um jogo que se foi, encantado com esta paixão que se chama futebol e que, apesar de todas as babaquices dos políticos, desejo manter viva no meu espírito.
No caminho para o estádio encontrei meu amigo Dante. Sim, Dante. Estranho alguém encontrar Dante no caminho para o estádio. Eu não estava cego, ou tinha uma lanterna, mas o destino estava traçado, para o céu ou para o inferno, que fosse, mas que fosse vermelho. Dante bebia uma singela garrafa de água e o convenci a tomar uma cerveja antes de entrar no estádio comigo. Depois de 3 horas, passavam das nove da noite, meia garrafa de cerveja não faria efeito se ele tivesse que dirigir para voltar pra casa. Na TV do Lucas passava aquele DVD da campanha de 1979. Admirados, na fila fo banheiro, eu e mais 3 ou 4 bebuns, comentávamos um jogo entre Inter e Cruzeiro de 30 anos atrás como se estivesse acontecendo ao vivo, alhieos ao outro aparelho que transmitia a vitória gremista sobre o Ipatinga. Além de craques, aqueles caras se atiravam na bola como crianças do fundamental na saída para o recreio. Atropelando tudo e todos. Numa bola de fora da área, Valdomiro, talvez o maior jogador da história da era Beira-Rio, que passou de unanimidade na vaia para o endeusamento terreno, matou uma bola com a direita, tirando um defensor da frente, e chutou de canhota, de fora da área, no canto direito do gol, deslocando o goleiro. Era um prenúncio. A pegada e o chute.
Nos acomodamos nas arquibancadas, lado norte, o lado do Gigantinho como é conhecido. Acomodar é um grande forçazão de barra. Nós estávamos de pé, perto da mureta, local que não terá ingressos na Copa de 2014, mas que amamos assim mesmo. Os bumbos balançando e uma ngurizada insana e emaconhada pulando sem parar. Mas não era da gurizada, que muitas vezes agride 0s torcedores comuns com berros do tipo “vamos pular!” Existem muitas formas de torcer. Uma delas é pular. Outras gritar. Vaiar o adversário. Cantar. Ficar em silêncio e rezar palavrões contra o juiz e contra o craque do inimigo. O Inter tinha dois adversários. O condicionamento do juiz e Neymar. Neymar parece um nadica vendo ele jogar ao vivo, a TV enobrece suas jogadas rápidas nos diversos ângulos, mas é inegável que não se pode deixar ele respirar. E foi assim que o desfalcado Inter trabalhou. Com um meio de campo brigador e possuído por algum demônio rollingstoneano, o Inter atravessava o vale da morte, junto comigo, Dante e mais 35 mil almas enlouquecidas.
Se no jogo contra os bolivianos a torcida pedia mais vontade dos jogadores, cantava sem parar e implorava por um massacre no ainda vivo na compétição, The Strongest, contra o Santos a torcida parecia invadir o campo com seu grito, tamanha era a concentração em apoiar o time. Um daqueles jogos emblemáticos em que a torcida se une ao grupo, como naquele já longínquo 5×1 contra o Paraná, e tantos outros exemplos de união entre torcida e time. O Inter precisava da torcida. A torcida precisava de um grupo que doasse mais que o sangue. A alma. O caminho para a glória. Um grupo que abandonasse o conforto e se jogasse aos leões. Os leões vem com nomes de santos. Se alimentam de carne viva. Os santos adentram o inferno de Dante, meu amigo e poeta, para nos enterrar vivos. É o desejo de Ganso & cia. Eliminar o Inter. O maior elogio que um adversário pode dar a outro. Jogar para destruí-lo. O Santos veio para aniquilar. O Inter, para ferver o caldo do demônio.
Em uma bola parada, o sempre vaiado, apupado, perseguido, limitado, Nei. fez um gol para entrar para a história das cobranças de falta. Uma cobrança indecifrável de tão perfeita. Se fosse outro esporte valia por 3. O Inter pra cima e o Santos atravessando o campo da desgraça com desdém até apertar o Inter em seu próprio caldeirão nos últimos quinze minutos do primeiro tempo. A desgraça se anunciava na noite quente de Porto Alegre. Dante ajeita os óculos nervoso. Eu grito, sei que estamos dando muito campo para o inimigo cavar suas trincheiras e nos encher de granadas. O inferno não é só um local tenebroso, é um estado de espírito. Nossos espíritos estavam em, chamas, o tempo demorava a passar, 5 minutos pareciam 3 prorrogações. Se pudesse o jogo teria só um tempo, Muriel se atirando como cusco faminto em salsichão quente de churrasco, o espeto do capeta cozinhando o vazio do meio campo colorado no fogo de chão do patudo. O gol santista no segundo tempo era questão de tempo. E foi.
Em uma única falha lateral, um cruzamento, e Alan Kardec ressuscitou as almas penadas que de vez em quando ressurgem nocs copos de mesa das casas coloradas. Quem era o fantasma da vez? A eliminação precoce em mais uma Libertadores. Como em 1993? Como em 2007? Não, o Inter, este Inter, com todos os seus desfalques, seus erros, seus medos táticos e indecisões doravalianas, merece mais. Merece uma chance no vale de lágrimas das oitavas. Um outro campeonato. Outro andar no inferno. Jesus Dátolo, São Damião, se abracem e dêem a mão para Dante, meu amigo poeta, conduzi-los à glória ou à desgraça. Os santos e os demônios só são verdadeiros quando envoltos pelas agruras do destino destemperado. Não existe meio termo. O Inter agora tentava puxar as forças que o predador Tinga perdeu depois de se elevar aos céus em vida e se tornar a quinta estrela no peito do Inter, aquela que nunca existiu, mas que poderia acompanhar as outras quatro na minha camisa fake retrô da Adidas. Outros tempos, onde camisas eram panos emblemáticos e não outdoors de bancos matreiros.
Se Messi é um extra-terrestre e Neymar um fora-de-série, Tinga é um predador, daqueles do cinema, incansável, procurando um combatente, outro, voltando, passando, driblando. Certa hora do jogo, e eu já estava sóbrio, até pelo nervosismo, juro que enxerguei 3 tingas no campo. E os 3 jogavam por 9. O Inter tinha 20 jogadores em campo. Mesmo assim, numa falha, num momento de devaneio, talvez Dante olhando uma bunda repentina que se ajustava na mureta das inferiores, sofremos o gol. A carne é fraca, diria Jesus pensando em Madalena, só que Jesus era Dátolo e Madalena era Damião, abandonado às traças no ataque, o meio campo colorado estropiado pelo caminho e o relógio, taque taque taque na cabeça, 45 minutos são 45, não são 15, não são 5. O suficiente para Moledo acariciar Neymar e fazer o que todo marcador do universo gostaria de fazer mas não admite. Derrubou o satã da baixada. Dante se desespera em seu inferno pessoal. Eu começo a rir. No desespero é que se encontra a felicidade. E a felicidade está nos pequenos momentos. Não vencemos. Não foi um bom resultado. Mas estávamos lá. No céu e no inferno. Na glória e na desgraça. O caminho de Dante é o mesmo para os dois destinos. No final do torneio, a sorte sorrirá para os perseverantes. Ontem, time e torcida perseveraram. Que, então, a sorte nos sorria.
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5 de abril de 2012 em 08:04
escapamos de levar um chocolate em casa graças ao muriel.
5 de abril de 2012 em 10:55
Tinga e Guinazu não tem espaço no INTER.
Se guinazu estivesse no lugar do SANDRO, nós tinha levado ferro de novo.
O inter, se jogar com os melhores, pode vencer.
Mas desde 2010 o Inter não joga com os melhores. Aliás, nem contrata zagueiro ra ter espaço pra INDIO e BOLIVAR, ainda.
11 de abril de 2012 em 02:52
Quem não tem espaço no Inter é tu, coreneteiro dos inferno… Tinga jogou muito, comandou e deu a alma pro time. Tu deve ter visto o jogo do Ipatinga
11 de abril de 2012 em 16:41
Então Tinga tem que jogar no lugar do DALE ou do OSCAR, qual tu escolhe???
Pq TINGA vira volante, só pra ter lugar no time, porque nunca foi volante. Tú como torcedor pós 2006 não lembra do TINGA como meia armador, meia atacante até no time de 2006?
Chupim do banhado !!
13 de abril de 2012 em 09:12
Chupim de banhado! hahaha! Tche, concordo em três coisas contigo: uma é que o Tinga foi armador (muito bom, como nessa partida contra o Santos em casa) em toda a primeira fase da Libertadores 2006 e naquele jogasso (1×2) em SP. Na última, Gigante, quando até marcou, tava de volante ao lado do Edinho, substituindo o Fabinho no 3-5-2 que o Abel montou. (Nas outras partidas, o Tinga não jogou). Esse time do Dorival, sem volantão, ele entra melhor que qualquer um por causa da saída de bola qualificada, comandando as ações do time com muita raça e fechando bem atrás (é um baita ladrão de bola e dificilmente perde ela). E volante ninguém marca. Acho que complementa bem com o Guinazu, que marca mais e sabe sair jogando, ou mesmo com o ótimo Sandro Silva (mas prefiro o Guina). Até porque no lugar do D’Ale e do Oscar (ou Datolo) não dá. Meia atacante não lembro do Tinga. Quando? Talvez só no gremio… Também concordo que falta a direção contratar zagueiro. Como é que me entra na Libertadores sem reposição logo ali? Mas discordo quanto ao Indio. O véio tá fininho, tá garantindo bem lá atrás e até o titular Moledo – que eu acho um baita zagueiro – tem mais falhas. Quanto ao Bolivar, acho que tem crédito. Não dá pra descartar assim. fez um 2011 ruim, mas um 2010 excelente. E é reserva. Se tivessem vindo o Naldo ou o Tolói (que não tem tanta amostragem assim) poeria ser melhor. Não sei… Concordo também que sou colorado pós-2006. Pós-2010 também. Sou sócio, vou em todas e nunca vaio nem corneteio o time. E por ser pré 1975 (meu primeiro jogo foi num freNAL de 01/05/75 com dois do Escurinho. Paulo César – rebatizado de Carpeggiani pelos cariocas – era o craque e Falcão, a revelação) tive uma infância egocêntrica: meu time ganhava tudo. Mas dos 15 aos 40 foi um filme de terror… Até que… Por isso, eu agradeço a Deus e ao Fernando carvalho, me penitencio apóio e não reclamo, porque tá dando certo. Um abraço
5 de abril de 2012 em 11:44
Que baita texto Marcelo, tu escreve com a alma, parabéns!
16 de abril de 2012 em 13:39
Muito bom o texto, mas tens que fazer um cursinho de como empregar a vírgula! tem muita licença poética..
16 de abril de 2012 em 13:43
Justamente é o porquê da existência deste espaço. Literatura e futebol. Não é jornalístico. É delírio. Erros gramaticais, propositais ou não (fica à escolha) fazem parte do manual inexistente. Obrigado pelo elogio. Abraço!
5 de abril de 2012 em 15:08
Que inveja de todos os colorados que estavam no estádio….
eu aqui do RN assisti pela internet.
Valeu pelo jogo e valeu pelo texto.
REci
5 de abril de 2012 em 21:51
O time jogou com alma pena q alguns jogadores nao entraram em campo, cito exemplos:
-Kleber fraquissimo ex-jogador nao marca erra quase todos os passes
-Everton, o guri e ruin demais …fico perdido o jogo todo não sei pq o Burrival Jr.insiste nesse cara.
– E Damião deslumbro ,subiu pra cabeça..sumiu do jogo.
7 de abril de 2012 em 14:32
everton???
Amigo, honestamente, te esqueces um pouco dos personagens do dragon ball e me responde:
Sentiu falta do guinazú???